FRAUDE NOS MEIOS DE PAGAMENTO DO E-COMMERCE: QUEM PAGA PELOS PREJUÍZOS?
Em 2013 o e-commerce faturou no Brasil 28 bilhões de reais, sendo que 76% dos consumidores optou pelo pagamento de sua compra através do cartão de crédito, o que significa que as operadoras do mercado de cartão movimentaram o ano passado através do e-commerce mais de 21 bilhões.
As principais operadoras do mercado de cartões de crédito e débito são CIELO e REDECAR. Tais empresas tem presenciado um grande aumento de lucratividade com a expansão do e-commerce e, em especial, com o serviço de antecipação de pagamentos feitos pelo cartão.
O lucro líquido da CIELO, por exemplo, aumentou 27,4% no primeiro trimestre de 2014, enquanto o Banco Central informa que, em março de 2014, 3,5 bilhões de reais foram concedidos por meio de antecipação de pagamentos de cartão às empresas no mercado em geral. São os recebíveis financiando o fluxo de caixa das empresas a um custo menor que o encontrado nas demais opções do mercado.
Diante desse quadro fica evidente que as operadoras do mercado de cartão de crédito prestam serviço imprescindível à sobrevivência das empresas que se dedicam ao e-commerce, seja por oferecer o principal meio de pagamento para as compras on line, seja por oferecer antecipação de recebíveis.
Apesar da alta lucratividade da prestação do serviço de meios de pagamento, quando há fraude no e-commerce, as operadoras do mercado de cartões impõem ao lojista todos os prejuízos decorrentes, pois o sistema financeiro estabeleceu unilateralmente a regra que impõe o risco do pagamento ao comerciante sempre que as compras forem feitas sem a captura presencial do cartão. Portanto, hoje, quem paga os prejuízos decorrentes das fraudes nos meios de pagamento do e-commerce são os comerciantes.
Todavia, os prejuízos decorrentes das fraudes no pagamento por cartão no e-commerce devem ser suportados pelas operadoras do mercado de cartões e não pelos comerciantes, pelos seguintes motivos: (i) desigualdade entre as partes a justificar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor; (ii) responsabilidade objetiva pela natureza da atividade e seu risco essencial.
-
Desigualdade entre as partes e relação de consumo
A jurisprudência nacional entende pela possibilidade do empresário ser consumidor de produto ou serviço fornecido por outra pessoa jurídica. A Ministra Nancy Andrighi do Superior Tribunal de Justiça já abordou, com a sabedoria que lhe é peculiar, exatamente o tema do empresário em relação às operadoras de cartões, para reconhecer a presença da relação de consumo diante da inconteste hipossuficiência do empresário que tem dramática necessidade e dependência do serviço oferecido no mercado com características de monopólio. Nesse mesmo julgado a Ministra conclui que: ”O empresário ou sociedade empresária (…), deve ser considerado destinatário final do serviço de pagamento por meio de cartão de crédito, porquanto esta atividade não integra, diretamente, o produto objeto de sua empresa.” (CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 41.056 – SP 2003/0227418-6).
Com a aplicação do Código de Defesa do Consumidor na relação entre a empresa de e-commerce e as operadoras de cartão o contrato firmado entre as partes é de adesão e as cláusulas abusivas não são válidas. Entre as cláusulas abusivas costumam estar previsões que estabelecem a possibilidade de interrupção arbitrária do serviço de meio de pagamento e o amplo controle da conta corrente da empresa.
Responsabilidade objetiva pelo risco da atividade
A súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça estabelece que: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”. A súmula 283 do mesmo Tribunal esclarece que: “As empresas administradoras de cartão de crédito são instituições financeiras (…)”. Portanto, as empresas operadoras de cartão devem responder objetivamente pelos prejuízos decorrentes de fraudes praticadas contra seu serviço de meio de pagamento.
Conclusão
Não é fácil impor o direito do pequeno e médio empresário contra o poder econômico das operadoras de cartão, mas a lei de consumo, sempre temida pelos comerciantes, agora vem em auxílio do empresário para compensar a desigualdade de forças e favorecer o desenvolvimento social e democrático expresso em nossa Constituição.
As empresas de e-commerce, vítimas de fraudes on line, tem fortes argumentos e apoio do Direito Pátrio para exigir que os prejuízos decorrentes das fraudes sofridas sejam suportados pelas operadoras de cartão que tanto tem lucrado com sua atividade de risco.
Tatiana Chiaverini é advogada sócia do Mehler Chiaverini Advogados, graduada em Direito e mestre em Filosofia do Direito pela PUC/SP.
* Essa publicação tem natureza informativa genérica e sua reprodução é autorizada com menção da fonte.
2014, Mehler Chiaverini Advogados.
www.mclaw.com.br
Rua Santo Antônio nº 446, salas 81 e 71
55 11 3104-0377 e 3105-3157
No Comments